Longe vão os tempos em que apenas associávamos a serra da Estrela à imagem da neve que a cada Inverno vai cobrindo os seus montes. Os atractivos desta que é a serra mais alta de Portugal Continental (1.993 metros de altitude) não se esgotam nessa possibilidade de fazer sky, snowboard ou de simplesmente brincar com a neve.
E para que também não subsistam dúvidas: a Estrela não é apenas um destino para a época mais fria do ano. As suas paisagens, os seus trilhos de natureza, a sua tranquilidade e o seu ar puro, tornam-na especialmente apetecível em tempos de veraneio (quem é alérgico aos congestionamentos que tomam conta do litoral já não quer outra coisa).
Talvez ainda mais extraordinário do que tudo isso é que esta serra reúne em si vários destinos e propostas. Pode (e deve) programar várias escapadelas, com a certeza de que tem muito território para palmilhar, inúmeras iguarias para degustar e um património ímpar.
Sabia que existem por ali 41 Aldeias de Montanha? Estão integradas numa rede – designada de Aldeias de Montanha – e são, todas elas, merecedoras de uma visita. Não tem de as percorrer de uma vez só, tanto mais porque estamos a falar de um território que abrange nove municípios (Fornos de Algodres, Seia, Gouveia, Oliveira do Hospital, Covilhã, Celorico da Beira, Guarda, Manteigas e Fundão). A sugestão passa, mesmo, por ir e voltar, sempre que possível, à montanha.
Anote as coordenadas, registe os atractivos de cada um dos destinos da rede Aldeias de Montanha, e comece já a reservar algumas datas na agenda. Depois, faça-se à estrada, com a garantia de que algumas das vias que irá percorrer lhe oferecem uma vista ímpar.
Algodres e Figueiró da Granja são as duas aldeias de montanha do concelho de Fornos de Algodres. Na primeira, o visitante deve perder-se no arruamento antigo e descobrir os muitos testemunhos da rica história desta localidade. No final, deverá procurar o miradouro do Comborço, a partir do qual terá um vasto panorama sobre o Vale do Mondego e a serra da Estrela. Em Figueiró da Granja, o guardião da aldeia, terá todo o prazer em guiá-lo numa visita ao museu de arte sacra da aldeia.
Onde encontrará, também, várias aldeias de montanha ímpares é no município de Seia. Especialmente procurado pela emblemática subida à torre ou pelas visitas aos Museu do Pão e Museu do Brinquedo, a verdade é que o concelho tem muito mais para oferecer. Sugere-se uma visita ao Centro de Interpretação da Serra da Estrela, local ideal para iniciar a descoberta à serra e às suas Aldeias de Montanha.
Na Lapa dos Dinheiros a sugestão passa por uma visita às quedas de água da Caniça, uma ribeira afluente do Alva. Ou (com mais tempo) um passeio mais exigente pela rota da Caniça, onde muito recentemente foi descoberta uma nova espécie de insecto para a ciência.
A poucos quilómetros encontrará Loriga. Aqui, é obrigatória a paragem na praia fluvial, uma praia localizada em pleno vale glaciário que oferece uma vista única. Na Primavera, recomenda-se umas das rotas mais exigente e gratificante da Rede de Caminhos de Montanha, a Garganta de Loriga que permite aceder a pé, através de um vale glaciário ao ponto mais alto da serra, a Torre. No Inverno, porém, esta rota apena se aconselha aqueles que tenham uma melhor condições físicas e uma maior experiência de percursos de montanha. Para repor as calorias gastas, nada melhor do que a Broa e o Bolo Negro de Loriga.
Melo, a “Aldeia Eterna de Vergílio Ferreira”, é outro dos destinos obrigatórios num périplo em torno das Aldeias de Montanha. Situada no município de Gouveia, esta aldeia deve ser descoberta através de dois percursos pedestres: um rural (infelizmente, muito afectado pelos incêndios) e outro urbano, com aproximadamente um quilómetro de extensão e que tem como narrativa o universo literário de Virgílio Ferreira e o ambiente rural em que se insere.
A Norte de Melo, encontramos outras das aldeias da rede, nomeadamente Folgosinho, onde os sabores de montanha ganham especial destaque. A visita aos casais de Folgosinho e à senhora da Assedasse é um circuito incontornável da serra da Estrela – aqui natureza, paisagem e homem estão em perfeito equilíbrio.
Cursos de água que marcam a paisagem
Conhecer as Aldeias de Montanha de Oliveira do Hospital é perceber o curso natural natural dos rios Alva e Alvoco e o que os seus ecossistemas ribeirinhos representam no contexto das vivências de aldeia. Se nas aldeias do Alto Alva encontramos cursos de águas mais selvagens, em São Gião e Alvoco da Várzeas, onde estes rios deixam a montanha, é evidenciada uma identidade própria que resulta da proximidade ao rio.
Em Alvoco das Várzeas, a partir do alto do arco da ponte medieval, poderá vislumbrar não só todo o território de relevo acidentado que o rio deixou, mas também os férteis campos que nas margens do rio se instalam. Em São Gião, recomenda-se uma visita à igreja matriz designada, pela sua monumentalidade, de Catedral das Beiras.
Novo destino, nova variedade de propostas: Covilhã. Além dos roteiros urbanos e cosmopolitas associados à temática da lã e à arte urbana – a visita ao Museu dos Lanifícios é obrigatória -, a Covilhã, pela sua localização estratégica (numa das entradas no Parque Natural da Serra da Estrela), tem muito para oferecer a quem a visita.
Sugere-se uma paragem nas Penhas da Saúde, a estância de Montanha que integra a rede de Aldeias de Montanha, que pode ser um ponto de partida para a descoberta de alguns dos mais emblemáticos locais da serra da Estrela. Exemplos? A Nave de Santo António e o Vale Glaciário de Alforfa. Na cabeceira do Vale de Alforfa encontra-se uma das mais antigas e emblemáticas barragens da serra da Estrela, a barragem do Padre Alfredo.
Celorico da Beira e os seus rebanhos
As Aldeias de Montanha de Celorico da Beira, Prados, Rapa, Salgueirais, Cadafaz e Vide entre Vinhas, mantêm um carácter agrícola e rural assente quer na produção de centeio, uma paisagem já muito rara em Portugal, quer na produção em regime extensivo de rebanhos, com destaque para a ovelha bordeleira e churra mondegueira, um dos segredos do queijo Serra da Estrela DOP.
A melhor forma de perceber a identidade destas aldeias é subir ao “miradouro natural” da Penha dos Prados, com acesso a partir de um desvio sinalizado situado na estrada municipal que liga Prados a Videmonte.
Numa altura que tanto se fala em abandono do mundo rural, nestas aldeias ainda existe uma dinâmica muito própria associada à agricultura de montanha que parece ganhar continuidade com agricultores mais jovens. A Casa Agrícola dos Arais, gerida por Célia Silva, é um excelente exemplo desta nova corrente de empreendedorismo jovem.
Na Guarda há vários locais de visita obrigatória – para além da descoberta da capital do concelho e distrito – num roteiro dedicado às Aldeias de Montanha. Siga até Videmonte e procure o senhor Afonso, simultaneamente presidente da junta e guardião da aldeia e entregue-se a uma verdadeira vivência de aldeia.
Daqui, apanhe a estrada em direcção ao lugar da Quinta da Taberna, um pequeno aglomerado agrícola, até há pouco ainda habitado, sobranceiro ao Mondego. Renda-se ao seu sossego e à sua paisagem. E não deixe de programar, também, uma visita ao pequeno Museu dos Meios, bem próximo da Aldeia de Montanha dos Trinta.
No município vizinho de Manteigas, os locais de visitação são, igualmente, muitos e diversificados. O Covão da Ametade, o Vale Glaciário do Zêzere e o Covão da Ponte ou o bosque de Faias de São Lourenço são alguns dos locais mais conhecidos.
No topo da lista aparece também o Poço do Inferno, a mais emblemática das cascatas da serra da Estrela. Em épocas mais frias, devido à precipitação, muitas vezes sob a forma de neve, a cascata apresenta-se em todo o seu esplendor.
Alcongosta, Alcaide e Alpedrinha, são as três Aldeias de Montanha do Fundão. Em Alcongosta, após o frio do Inverno, as encostas cobrem-se de um manto (branco) de flores, anunciando o sabor de um dos mais emblemáticos símbolos do Fundão, a cereja. É nesta aldeia que decorre, no segundo fim-de-semana de Junho, a maior celebração da cereja do país.
Alcaide, a aldeia dos míscaros, dista apenas sete quilómetros do Fundão e tem uma vista privilegiada para a Cova da Beira e Serra da Estrela. A abundância de cogumelos nos bosques em redor da aldeia, a cada Outono, determinou a realização de uma das mais carismáticas festividades dedicadas aos cogumelos silvestres. Anote na agenda: acontece no terceiro fim-de-semana de Novembro.
Já Alpedrinha, é a Aldeia de Montanha de localização mais meridional. Alojada nas vertentes sul da serra da Gardunha, esta localidade dá a conhecer os seus usos e costumes no Museu Etnográfico de Alpedrinha. É também no seu território que se celebra um dos mais emblemáticas encontros de pastores, os Chocalhos- Festival dos Caminhos da Transumância (terceiro fim-de-semana de Setembro).